Páginas

domingo, 5 de dezembro de 2010

Prisão de Carne

E ainda que tivesse livrado-se da moral e seus atos eram agora súditos de seus desejos, esta camisa de força impenetrável mostrou-se impossível de se desvencilhar.

Maldita condição carnal, poderosa o suficiente para aprisionar o mais selvagem e amorfo dos seres. A alma, como quero-te livre! Para poder então dançar com os ventos irmãos e em seus passos encontrar o que a preencheria suave e intensamente. Tão forte e poderosa, porém limitada, sua condição faz meus olhos sucumbirem às lágrimas e meu coração ainda insatisfeito.


Hadassa - Carol.

A Máscara do Carrasco

Sem se importar com o tempo e aparência, pela primeira vez revelou-se, fez exatamente o que seu coração pedia e desprendida da moral, foi de encontro com suas verdadeiras vontades.

Ineditamente não se perguntava o porquê, este já não era importante e sim os fatos em si. A leveza e sinceridade daquele momento tomaram conta de seu interior e sua intensidade fez-se transparecer para além de pensamentos, em ações.

Via-se agindo por impulso, um impulso tão forte que se tornava inquestionável, a razão de fato. O pesado impulso que fazia a leveza do momento.

E nessa relação intima com seu ser – que a muito não vivenciava tamanha cumplicidade- redescobriu-se e abriu-se para quem mais temia, a si própria.

Ela pode finalmente ler e entender claramente seus verdadeiros sentimentos e pensamentos, sem serem cobertos pela máscara da moral – imposta tão cedo em nossas mentes.

Livrou-se do que a segurava e agora pairava e desfrutava da simplicidade do livre pensar. Compartilhava aquele momento só e somente com seu coração, que sorria satisfeito e completo. Porém se perguntava, quando foi que deixou de ser cúmplice de si mesma?

Quando e como a obrigaram a crescer e deixar sua simples inocência para trás? Ah, como sentia falta daqueles dias em que tudo tinha tantas cores e sua vida era regida pela doce, inocente e simples verdade.

Inocência essa que foi brutalmente arrancada e substituída por regaras, regras e leis de boas maneiras e conduta. Fizeram-na guardar, mais que isso, esconder - como se fosse algo a se envergonhar – sua essência e incorporar em seu lugar as imposições de uma sociedade falsa e dissimulada que toma conta de seus filhos mais nobres sugando-lhes a luz da singularidade.

Desperdício grotesco, pobres seres, faltava-lhes força para lutar conta esta criminosa corrompida. Eram tomados quando ainda tão jovens que não dispunham dos artifícios da consciência e vontade própria, puros e até então sem malícia, eram tocados por essa suja garra e jogados no sombrio e destorcido mundo dos adultos.


Hadassa - Carol.

Prisão de Regras

Se sinto essa avassaladora vontade dentro de mim, o que me impede de realizá-la? O que pode ser mais forte que isso?

Me consome como castigo por a ignorar, maldita desejável e inalcançável, plantada fundo em minha alma, tão profundo!

Quando é que vou poder te provar? Livrar-te dos laços da moral para que assim cresça e semeie suas sementes ao vento que leva meus sussurros e suspiros aos lugares que já não posso chegar.

Fortes raízes, essas que me prendem ao chão, enfincadas ao solo por meus ancestrais e que me seguram até os dias de hoje.

Hadassa - Carol.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A Leveza e o Peso

Se cada segundo de nossa vida deve se repetir um número infinito de vezes, estamos pregados na eternidade como Cristo na cruz. Esta idéia é atroz. No mundo do eterno retorno, cada gesto carrega o peso de uma responsabilidade insustentável. É isso que levava Nietzsche a dizer que a idéia do eterno retorno é o mais pesado dos fardos.
Mas será mesmo atroz o peso e bela a leveza?
O mais pesado dos fardos nos esmaga, verga-nos, comprime-nos contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos, porém, a mulher deseja receber o fardo do corpo masculino. O mais pesado dos fardos é, portanto, ao mesmo tempo a realização da imagem vital mais intensa. Quanto mais pesado é o fardo, mais próxima da terra está a nossa vida, e mais real e verdadeira ela é.
Em compensação, a ausência total de fardo leva o ser humano a se tornar mais leve que o ar, leva-o a voar, a se distanciar da terra, do ser terrestre, a se tornar semi-real, eleva seus movimentos a ser tão livres como insignificantes.
O que escolher, então? O peso ou a leveza?
Foi a pergunta que Parmênides fez a si mesmo no século VI antes de Cristo. Segundo ele, o universo está dividido em pares de contrários: a luz / a escuridão; o grosso/o fino; o quente/o frio; o ser/o não-ser. Ele considerava que um dos pólos da contradição é positivo (o claro, o quente, o fino, o ser), o outro, negativo. Essa divisão em pólos positivo e negativo pode nos parecer de uma facilidade pueril. Exceto em um dos casos: o que é positivo, o peso ou a leveza?
Parmênides respondia: o leve é positivo, o pesado é negativo. Teria ou não teria razão? A questão é essa. Só uma coisa é certa. A contradição pesado/leve é a mais misteriosa e a mais ambígua de todas as contradições.

A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Criatura

Se para realizar meu sonho dependo do tempo, porque ele não me é generoso? Porque não me permite o possuir? Selvagem criatura que se recusa a ter dono.

És tão sábio e então me pergunto: Quem sou eu para questioná-lo? Regente de nossas vidas, desde o início é você que me carrega rumo ao fim.

Porém te suplico, como mero ser subordinado, permita-me poder aproveitá-lo com aquilo que eu gosto e não com obrigações a mim impostas.

Carol.

Os élitros de uma alma

E se pudesse então voar, se desprenderia das correntes da matéria e iria de encontro com seu mais puro anseio por liberdade. Iria deixar-se fluir pelos ventos e brisas do pensamento e espírito liberto, solta e sem peso algum.

Aquela suave força contornava sua carne e se infiltrava pelos poros, para agora então fazer parte de seu ser, sua essência. Apenas flutuava, seu coração palpitava e mesmo assim parecia calmo, pois agora tivera seu pedido atendido e ela suplicava para que cada vez mais aquilo tomasse conta de si, pois jamais sentira-se tão completa.

Marion - Carol.